A produção brasileira de leite nos últimos anos evoluiu em quantidade e produtividade. Entre 1980 e 2000, saltou de 30 milhões para 43 milhões de litros/dia. E este valor alcançou 97 milhões de litros/dia em 2023, mostrando notável evolução no médio prazo. Em paralelo, o número de vacas ordenhadas diminuiu de 17 milhões para 16 milhões entre 1980 e 2023.
Esses números indicam que houve melhoria expressiva na produtividade brasileira, consequência de um processo contínuo de inovação tecnológica. Tal indicador evoluiu de 676 litros/vaca em 1980 para 1.105 litros em 2000 e 2.259 litros em 2023. Ainda é um patamar modesto se comparado com os principais países produtores e exportadores de leite e derivados, mas representa com destaque um salto importante na evolução tecnológica do setor.
Houve também importante mudança espacial na produção leiteira neste período. As cadeias de valor, ao se modernizarem e tornarem mais intensivas no uso de tecnologia e capital, tendem a ter suas atividades espacialmente mais concentradas, favorecendo a oferta de bens e serviços e reduzindo o custo de logística. Isso também está acontecendo com a cadeia do leite.
Ordenando os municípios brasileiros de maneira decrescente em função da densidade da produção leiteira no município (expressa em quantidade produzida dividida pela área do município), pode-se determinar quais áreas produziram metade do leite brasileiro entre 1980 e 2023. Uma com maior densidade de produção e outra com menor densidade (figura 1).
Em 1980 metade do leite brasileiro advinha de uma área de 402 mil km2. Esta área se localizava principalmente nos estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, produzindo 15 milhões de litros de leite/dia. Em 2000, a metade do leite brasileiro, 27 milhões de litros/dia, passou a ser produzido em uma área de 430 mil km2, um pouco superior à observada há 20 anos. Minas Gerais continuou a ser o estado mais importante nesta área de produção mais adensada, seguido de Rio Grande do Sul, São Paulo, cuja participação se reduziu de maneira significativa, e Goiás, que na época despontava como importante área de expansão da pecuária leiteira. Em 2023, metade do leite brasileiro, 48 milhões de litros/ dia, passou a ser produzida em uma área bem mais concentrada: 284 mil km2
Número de vacas reduziu e produção de leite triplicou
Nesses primeiros anos do século XXI, intensifica-se o processo de concentração espacial da cadeia do leite, ilustrando as profundas mudanças de escala de produção e de nível tecnológico que aconteceram e ainda estão em curso. Minas Gerais continua a ser o estado que mais se faz presente espacialmente nesta área.
No entanto, se consolida o forte protagonismo da região Sul na produção leiteira brasileira. Os estados do Paraná e Rio Grande do Sul também participam expressivamente nesta área de maior concentração da produção. Chama a atenção também a emergência de uma área de maior concentração da produção leiteira no Nordeste, com destaque para Pernambuco, Alagoas, Ceará e Sergipe (figura 2).
Considerando os dois “Brasis” que produziram metade do leite brasileiro, o de maior e o de menor densidade da produção, é notável a evolução tecnológica, traduzida em produtividade, ocorrida nas áreas de maior concentração da produção. Nessas regiões, ainda que o número de vacas ordenhadas tenha se reduzido de 6 milhões para 5 milhões entre 1980 e 2023, a produção de leite mais que triplicou no período.
Assim, ainda nessas regiões, a produtividade evoluiu de 968 litros em 1980 para 1.600 litros/vaca em 2000. E alcançou 3.830 litros/vaca no ano de 2023, volume próximo ao observado na Nova Zelândia. Nestas áreas, a concentração da produção leiteira se intensificou saltando de 38 litros para 170 litros de leite/dia/km2 entre 1980 e 2023. As áreas de menor concentração de produção – que respondem pela outra metade da produção do leite do país – também assistiram à evolução na produtividade e na concentração da produção leiteira, mas em menor intensidade (tabela 1).
Como se nota, a produção de leite no Brasil aumentou de volume e em produtividade e se concentrou espacialmente entre 1980 e 2023. As regiões de maior concentração da produção, que responderam por metade do leite produzido no país, apresentaram maior dinamismo, o que resultou na evolução da produtividade e da própria concentração espacial da produção, criando um hiato entre os dois “Brasis” que produzem leite. Este é um movimento inevitável na consolidação da cadeia de lácteos, mas representa um importante desafio socioeconômico para o outro “Brasil”, menos dinâmico.
Fonte: Anuário Leite 2025 - Embrapa Gado de Leite